O melhor pneu para a minha mota é….
Se nunca estiveste envolvido ou presenciaste uma conversa sobre qual o melhor pneu para uma qualquer mota é porque não fazes parte do mundo das duas rodas, em estrada, ou fora dela.
Ainda assim, será que os conselhos que damos ou recebemos são os corretos, ou ficam-se somente por serem bem intencionados?
No artigo desta semana vamos ajudar-te a entenderes a fundo como escolher o melhor pneu para ti, tal como o que é que essa frase realmente significa.
MARKETING VS REALIDADE
O ser humano é um dos poucos animais que nasce basicamente sem capacidades.
Sem capacidade de andar, falar, ou até mesmo de se alimentar sozinho, razão pela qual existe uma obrigação da parte dos pais de não só dar a qualquer novo humano as ferramentas para sobreviver, mas igualmente para prosperar.
Se assim o é em relação ás mais básicas necessidades da vida, também o é em relação a tudo mais, demonstrando claramente que ninguém nasce ensinado em relação a nada, e que necessitamos sempre de algum tipo de mentoria ou de ajuda para evoluir e crescer de forma consistente e sustentada.
No que diz respeito a pneus, esse farol de informação idónea está longe de ser qualquer um dos fabricantes, afinal, de uma maneira ou de outra, todos eles dizem de forma perentória que o seu pneu é o melhor do mercado.
A internet está cheia de comparativos, no entanto, e por todas as marcas dizerem que o pneu deles é o melhor, é importante encontrar comparativos que não se limitem a citar comunicados de imprensa e a dar uma opinião generalista no fim. Imagem via advpulse.com
Se a necessidade de o fazerem é relativamente clara, é obviamente enganosa, afinal, nem todos podem ser os melhores, e em alguns casos, nem a definição de pneus 50/50 ou 70/30 escolhida pelos fabricantes, por exemplo, encontra sempre a concordância do mercado.
Assim, de forma a compreendermos qual o melhor pneu para nós, devemos primeiramente deixar de lado os chavões publicitários e as letras gordas das páginas dos fabricantes, e forcarmo-nos antes nas pequenas, quando elas existem.
O SEGREDO ESTÁ NA RECEITA
Já falamos no passado sobre pneus, como eles funcionam, tal como sobre os princípios de tração, por exemplo, mas muito ficou por dizer.
Os compostos que constituem as borrachas, tal como a sílica, o jogo que os fabricantes têm de fazer entre a resistência de rotação do pneu versus o seu desgaste, o padrão do pneu cuidadosamente desenhado para limpar desde água até pedras, tudo é pensado ao pormenor de forma a produzir a melhor receita possível.
Considerar tudo isso, poderíamos dizer que para escolhermos o nosso pneu ideal deveríamos todos dominar estas matérias, mas isso não é uma realidade, e mesmo que fosse, grande parte das receitas de qualquer fabricante são segredos bem guardados.
Todos compreendemos que pneus de competição fazem diferença na performance. Os que equipam as nossas motas não são diferentes, porque influenciam directamente a nossa confiança e desempenho. Imagem ridersturf.com
Assim, restam-nos de uma maneira geral poucas formas de análise, sendo que uma utilizada por muitos deve ser logo à partida eliminada de qualquer método de seleção, e essa é, escolher um pneu de substituição só por ser o original da mota.
À exceção de algumas menções honrosas, nenhuma marca escolhe um pneu por esse ser definitivamente o melhor par mota/pneu, e isso é algo que nem sequer deveria ter de ser discutido.
É obvio que por norma uma mota de fora de estrada tende a vir equipada com pneus com características de fora de estrada, mas só isso não faz desse pneu o indicado para ninguém, nem tão pouco para essa mota.
A escolha do pneu por parte do fabricante é puramente económica, já que o interesse final de qualquer marca é a maximização de lucros.
Mesmo que assim não o fosse, seria impossível para uma marca acertar no melhor calçado, uma vez que pneus não são feitos para diferentes tipos de motas, pneus são feitos para diferentes tipos de pilotos.
A forma como cada um vê e utiliza o seu pneu é extremamente pessoal, porque tal como em qualquer receita que cozinhemos em casa, cada um acaba sempre por adicionar o seu toque pessoal, e isso, como todos sabemos, altera drasticamente qualquer prato, para o melhor, ou para o pior.
O TOQUE PESSOAL
Da mesma forma que quando lemos uma receita que queremos fazer gostamos de experimentar condimentos e escolher adequadamente os nossos produtos base, com pneus a metodologia deve ser semelhante.
Estou à procura de um pneu de estrada, ou de fora de estrada?
Quero um pneu com muita tração, ou com muita durabilidade?
Gosto de pneus mais rijos, ou pneus que sejam muito moles?
Estas e outras perguntas devem fazer parte do checklist individual de cada um, tornando-as a primeira razão pela qual existem graves problemas em perguntar aos amigos ou nas redes sociais “qual é o melhor pneu” ou até mesmo “que pneu recomendam”.
Quantos amigos tens assim? Meme BN Adv
Mantendo-nos na analogia culinária, apesar de haver consenso sobre este ou aquele restaurante ou prato, a experiência que cada um retira de cada garfada é tão pessoal que é virtualmente impossível de partilhar a 100% a opinião de outro alguém.
Assim, essas perguntas generalistas a serem feitas em redes sociais, devem servir como meio de analise média de mercado, e não como forma de encontrar uma resposta definitiva.
Afinal, pneus, principalmente no mundo do Adventure e dual-sport - e à semelhança das motas em si - são um exercício de compromisso, e não podendo falar por nenhum de vocês, posso garantir que pessoalmente não gosto de deixar ninguém escolher por mim os compromissos que tenho de fazer.
A REGRA DO COMPROMISSO
Ainda que hoje em dia não existam propriamente pneus maus, por definição, se um pneu dura muito, isso é atingido por comprometer a sua capacidade de tração, sendo o inverso igualmente real.
Um pneu de carcaça rígida, além de ter um feedback claramente diferente de um de carcaça mole, pode também apresentar problemas se for necessário uma reparação de uma câmara de ar no meio do mato, por exemplo.
Um pneu brilhante fora de estrada em termos de durabilidade e tração, por norma, tende a faze-lo comprometendo as suas capacidades em estrada, tal como tende a ter um zoar em alcatrão que para muitos se torna incomodativo.
Até pequenas coisas como um vidro de dimensão diferente afeta directamente a forma como ouvimos ou não a zoada de um pneu. É crucial experimentar qualquer pneu na nossa mota antes de assumir que o mesmo é barulhento, o nosso setup e tolerância faz toda a diferença. puig.tv
Ainda assim, o próprio barulho de pneus cardados em estrada é altamente variável com fatores como o tipo de capacete a uso, e até mesmo a capacidade auditiva do piloto, factos que fortemente influenciam a opinião de cada um sobre este ponto.
Com estes e outros fatores em mente, torna-se simples de entender que o nome do jogo é compromisso, e isso significa que cada um sabe de si, e que acreditar na opinião cega seja de quem for que diga que “este é o melhor pneu”, é meio caminho andado para o fracasso.
Da mesma maneira, alguém que diga que um pneu é horroroso, pode e muito provavelmente estará correto, no entanto, correto no seu ponto de vista, o que significa que esse mesmo pneu pode ser perfeito para mim, que o irei analisar de um ângulo completamente diferente.
O PNEU É PARA O PILOTO, E NÃO PARA A MOTA
Vamos assumir alguém, vamos chamar-lhe piloto A, que faz maioritariamente estrada, faça sol ou chuva, ocasionalmente vai á terra, talvez uma ou duas vezes por mês, e quando o faz vai sempre em percursos de Classe 1 a 2 no máximo.
Podes consultar mais detalhadamente o sistema de classificação de terrenos da BN Adv diretamente no nosso site.
Por outro lado, temos alguém, o piloto B, que estrada só faz para fazer ligações entre trilhos, mesmo que isso implique alguma autoestrada, usa abafadores nos ouvidos e musica no capacete, e quando chega á terra faz terrenos de Classe 3 e 4.
Vamos ainda adicionar o piloto C, que não faz estrada a não ser quando o trilho não permite outra hipótese, já que leva a mota na carrinha até ao inicio das suas aventuras, na terra só faz terrenos de Classe 3 a 5, e sempre que sai com a mota é para fazer tiradas de múltiplos dias com centenas de kms por dia.
Para este exemplo, vamos assumir que todos estes três pilotos utilizam exatamente a mesma mota.
Pensar que os três usam o mesmo pneu é errado, mas não menos errado do que assumir que qualquer um deles irá diretamente, e quando questionado, ter uma visão empática do próximo, algo que lhe permite ver os benefícios que uma diferente escolha de pneus pode oferecer a outro tipo de utilizações particulares.
Afinal, se analisarmos a situação na sua generalidade, de uma forma ou de outra todos eles fazem estrada e terra com a mesma mota, por isso, para fazermos a escolha de pneus acertada vemo-nos obrigados a pensar ao pormenor.
Pneus, tal como qualquer outro acessório da mota, devem então ser escolhidos com base em três pontos fulcrais; o propósito que vão cumprir; se nos transmitem confiança e segurança; e onde estamos dispostos a comprometer.
Se nesta fase o compromisso se torna fácil de compreender, a confiança e segurança pode ainda estar confusa para alguns.
Pilotos experientes e conhecedores conseguem esticar o limite de alguns pneus com excelentes resultados. Imagem via riderzlaw.com
Vamos então adicionar o piloto D, que faz exatamente o mesmo que qualquer um dos outros três pilotos, vamos dizer por exemplo, o piloto B, mas ao contrário deste, o piloto D começou a andar de mota á 1 ano, quando o outro tens mais de 10 anos de experiência neste tipo de utilização.
Essa diferença de experiência implica que ambos os pilotos, apesar de fazerem exatamente o mesmo uso da mesma mota, o fazem com ritmos e níveis de agressividade diferentes, tal como que vão buscar feedbacks muito distintos da mota e dos pneus.
Assim, mais uma vez voltamos á ideia de que pneus são feitos para pilotos e não para motas, uma noção crucial de manter em mente.
COMO ESCOLHER O PNEU CERTO
Já entendemos que escolher pneus é um compromisso.
Já entendemos que o pneu do nosso amigo, ou até mesmo o que vêm de origem para a nossa mota não é obrigatoriamente o melhor para nós.
Já entendemos também que á medida que vamos tendo mais experiência, alterando a nossa forma de conduzir, ou até mesmo somente impondo diferentes níveis de agressividade, podemos ter de escolher pneus diferentes, então, falta-nos agora saber como fazer a escolha certa.
Infelizmente, esta é a parte ingrata da temática dos pneus, é que não existe uma resposta correta, o que existe, no entanto, é um método para a atingir, um que é moroso, trabalhoso, mas muito eficaz na sua generalidade.
Infelizmente tentativa e erro é a melhor forma de aprender que pneus funcionam para nós e não, e é uma que nunca vai parar. Imagem pinterest.com
Esse processo assim o é porque utiliza a mesma base de trabalho que qualquer investigação cientifica usa, tentativa e erro baseada em dados, por isso, o primeiro passo é a recolha dos dados que temos.
Para essa recolha, devemos então tentar agregar tanta informação quanto possível.
Qual o teu ritmo de andamento, qual a tua experiência, a que velocidades gostas de rolar, em que tipos de piso passas mais tempo, qual a durabilidade que esperas de um pneu, o barulho do pneu é uma coisa que te incomoda muito ou não, em que condições climatéricas vais andar, estas e outras perguntas devem ser analisadas.
Depois dessa analise, vem a parte do compromisso, a altura em que depois de veres que o mercado simplesmente não têm nenhuma oferta que responda a todas as tuas necessidades, tens de escolher que pontos são mais importantes para ti, e do que estás disposto a abdicar.
Se fores incrivelmente sincero contigo, e fizeres esta analise sobre as tuas reais necessidades e compromissos atuais, e não a pensar na viagem que um dia gostavas de fazer, ou naquele passeio esporádico de dois ou três dias que gostas fazer com os teus amigos, vais chegar a um ponto fulcral da escolha de qualquer pneu.
Vais chegar ao ponto em que ou encontraste duas ou três opções que cumprem o que precisas, ou se queres pedir conselhos, vais poder apresentar a pergunta com todos os dados que tens, algo que vai largamente ajudar a filtrar os reais conselhos dos comentários egoístas e descontextualizados de quem só quer falar da sua própria experiência.
TENTATIVA E ERRO
Se fizeste esta analise de uma forma justa para contigo mesmo, deste por ti não só com uma lista de potenciais pneus, mas também com uma forte base de dados.
Assim, estás agora preparado para começar os teus testes.
Se estiveres a escolher um pneu para um aventura em que possas ter de trocar o pneu ou uma câmara em campo, deves garantir que o consegues trocar. Certos pneus têm uma carcaça muito rija que pode ser muito difícil para alguns de conseguir lidar somente com sacas. Imagem de advpulse.com
Se de alguma forma o pneu que tens instalado na tua mota cumpre pelo menos a maioria dos pontos que procuras, gasta-o até ao fim.
Esse tempo de teste vai-te permitir não só confirmar se as tuas considerações iniciais estavam corretas ou precisam de ajuste, mas igualmente, ajudar-te a potencialmente adicionar mais alguns pontos que podes não ter equacionado no inicio.
Se o pneu que tens na tua mota não cumpre de forma nenhuma o que procuras, como por exemplo teres um pneu estradista quando queres fazer fora de estrada, então tens o teu trabalho dificultado.
Essa dificuldade vem pela forma de um teste cego, em que vais ser obrigado, sem dados suficientes, a escolher uma das hipóteses que te apareceram depois da tua análise inicial, e começar os teus testes dai.
Pneus por norma não duram muitos kms, por isso, rapidamente vais dar por ti a necessitar de uma troca, e é nessa fase que mais uma vez vais ter de agarrar nas tuas considerações iniciais, tal como nos resultados do teu teste inicial.
Vais ver que com toda essa informação te vão sobrar poucas escolhas no mercado para qual poderá ser o teu próximo pneu, e escolhendo a próxima opção, o processo de tentativa e erro repete-se.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Houve alguns pontos que não foram falados, tal como preços, pressões, ou até mesmo em que ponto o nosso processo cientifico para com pneus pára, e não o foram por uma razão clara.
Se valores monetários devem entrar nas considerações e compromissos, e as diferentes pressões no processo de testes, tal como com a ciência, o processo de descoberta nunca termina.
As nossas considerações e necessidades, tal como onde estamos dispostos a aceitar compromissos, mudam, razão pela qual alguns pilotos acabam por escolher trocas sistemáticas de pneus para ter sempre o pneu certo na altura certa, ou até mesmo ter dois jogos de jantes para se ajustarem mais rapidamente a cada situação.
Da mesma forma, a nossa experiencia e técnica mudam, tal como a oferta do mercado com pneus novos a aparecerem, e antigos a saírem de circulação.
Motas elétricas como a Alta Redshit e a Stark Varg já estão hoje a forçar alteração ás técnicas de condução institucionalizadas, sejam elas da vertente mais empírica ou mais cientifica. Imagem mxnews-online.com
Eu, por exemplo, durante anos usei o mesmo tipo de pneu, porque durante esse tempo respondeu ás minhas necessidades.
Quando deixou de o fazer, troquei, com os pneus que os substituíram a deixaram-me feliz km após kms, ainda assim, hoje, a minha técnica e ritmo alteraram-se, fazendo com que tenha atingido o limite do que os meus atuais pneus permitem, obrigando-me mais uma vez a escolher uma nova opção.
Ainda assim, por já ter muitos anos de recolha de dados, as minhas trocas hoje em dia são feitas na base de palpites calculados, e não de escolhas cegas ou aproximadas.
Conhecimento é poder, sinceridade da analise de necessidades pessoais é primordial, e tentativa e erro é a única forma de desenvolver a experiência necessária para por tudo em perspetiva.
Lembra-te, os pneus servem as necessidades pessoais de cada piloto, e isso significa que por mais tempo que demores a encontrar o pneu perfeito para ti, ele pode não ser perfeito para sempre, mas todos os que experimentaste pelo caminho foram uma excelente escola na tua evolução motociclística.