Etiqueta e segurança nos trilhos para motas

Etiqueta e segurança nos trilhos para motas

Assim que se sai das pistas de competição, rapidamente entendemos que o mundo do fora de estrada têm mais que se lhe diga do que uma pura necessidade de chegar em primeiro lugar.
 
A nossa segurança e a de todos os demais, tal como as regras de etiqueta e de bom senso que devemos usar como estandarte, formam as fundações que regem esta nossa atividade.
 
Hoje, vamos falar exatamente dessas fundações, e partilhar não só informação que muitos desconhecem ou nunca pensaram, tal como relembrar conceitos que todos devemos ter sempre presentes.

PRESERVAÇÃO DA INTEGRIDADE FISICA

Não interessa o quão bem conduzimos, dominamos técnica, ou qualquer outro ponto chave de controlo da mota, se não estivermos focados no que existe para lá da nossa bolha “homem/máquina”, não estamos a maximizar a nossa segurança.
 
Isso quer então dizer que atenção a elementos como condições climatéricas, saúde geral do piloto, ou até mesmo o nosso equipamento de segurança são cruciais para o bom resultado diário de uma aventura motociclística.
 
Com isso em mente, torna-se redundante perdermos aqui tempo a dizer que devemos andar sempre de capacete, e adaptar o restante dos nossos equipamentos de segurança ao tipo de terreno que estamos a atacar.

Quantas coisas erradas consegues apontar nesta imagem? Foto via Goon Riding


Por exemplo, não utilizar botas de estrada para fazer enduro ou motocross, algo que na sua essência é relativamente intuitivo e fácil de empregar.

Assim, torna-se importante aproveitarmos este nosso tempo para falar em tópicos pouco discutidos, e entre eles, quero começar por dois que penso que tendem a não ter o tempo de antena merecido.

HIDRATAÇÃO

Estando nós num pais de temperaturas elevadas e da cultura “da mini”, sinto-me obrigado a falar de hidratação.
 
No entanto, por hidratação ser um artigo por si só, vai ser impossível cobri-lo aqui na sua totalidade, ainda assim, facilmente se consegue partilhar alguns pontos importantes de reter.
 
Pontos tal como o conhecimento de que bebidas com açúcar, álcool, ou cafeina são de evitar quando as temperaturas apertam e começamos a derreter em cima da mota.
 
Isto assim o é porque estas bebidas, entre outros efeitos, são diuréticas, o que em vez de nos ajudar a reter eletrólitos como sódio e potássio, vai-nos fazer perde-los ainda mais depressa.



Existem poucos prazeres como uma cerveja gelada num dia quente, mas é importante lembrar que além de muitas serem ilegais se ainda formos conduzir, também vão ajudar a nossa desidratação. Foto de autor desconhecido


Ainda assim, isso não significa que beber cinco litros de água em vez de um ou dois por dia nos vá ajudar a manter uma boa hidratação, já que aqui, quantidade não significa diretamente qualidade.
 
Isto assim o é porque a água em si não é propriamente rica nos minerais que necessitamos para estarmos bem hidratados.
 
Assim, a ingestão em excesso de água não só não vai ajudar, como a certo ponto vai prejudicar, com o corpo a chegar a um estado de hiper-hidratação, uma situação que no limite é fatal, e que por não ter os sintomas da desidratação, pode ser mais difícil de identificar e gerir.
 
Com isto em mente, manter uma boa alimentação com recurso a vegetais e frutas - esses sim naturalmente ricos nos minerais que necessitamos - tal como saber ajustar as nossas bebidas eletrolíticas ás diferentes necessidades, vai-nos manter longe de problemas.
 
Problemas esses que podem ir desde uma simples boca seca ou dores de cabeça, até cansaço, sonolência e tonturas - reações extremamente perigosas quando se conduz - ou no limite, a morte.
 
E não se desenganem, desidratação e hiper-hidratação não são somente problemas limitados a atletas a competir, são abrangentes a qualquer ser humano, dentro, ou fora da mota, tornando-se assim uma temática que todos devemos manter presente.

NÃO SEJAS ATROPELADO

Cair faz tão parte de fazer fora de estrada como ter de meter gasolina ou trocar de pneus, e confrontados com essa realidade, tendemos a adotar uma de duas atitudes quando a nossa mota deixa de estar vertical.
 
Por um lado, temos aqueles que aproveitam a situação para tirar o máximo de fotos possível do acontecimento, por outro, temos aqueles que tão rapidamente quanto conseguem fazem o que for preciso para levantar a mota do chão antes que alguém repare.


Clássicos dificilmente deixaram de ser clássicos. Foto via ADV Pulse


Se em ambiente competitivo a velocidade com que podemos voltar á corrida é crucial, em ambiente lúdico, o ponto primordial é sempre a nossa segurança, e de forma a maximizar isso, devemos usar o nosso tempo como ferramenta.

Temos então de começar por entender que uma queda gera automaticamente uma forte reação hormonal no nosso corpo.

Assim, a usar adrenalina como combustível, facilmente conseguimos levantar uma mota de 200kg sem utilizar boas técnicas, com lesões graves em músculos e tendões, e até mesmo com ossos partidos.

Dessa forma, a opção de parar para tirar umas fotos parece ter vantagens, pois oferece o tempo necessário para o corpo relaxar e se estabilizar, algo que nos vai permitir conscientemente entender se temos alguma lesão mascarada pelo pico de adrenalina, ou não.

Ainda assim, isso não significa que aproveitar para atualizar o Facebook ou o Instagram seja a melhor escolha.

Quedas acontecem em qualquer parte do track, e isso quer dizer que podem - e muitas vezes acontecem - em curvas cegas, subidas sem visibilidade, ou qualquer outro local onde trafego numa ou noutra direção não nos consegue ver.
 
Com isso em mente, torna-se importante seguir uma pequena checklist para garantir a nossa segurança durante o processo de levantar a mota.
 
Primeiro, devemos desligar o veiculo e garantir que estamos inteiros, algo fácil de fazer passando as mãos pelo corpo, fazendo umas respirações fundas para baixar o ritmo cardíaco, e em quedas mais agressivas mas não incapacitantes, tirando o capacete, luvas e casaco.
 
O tempo despendido nesse processo vai ajudar a reequilibrar níveis hormonais, e desmascarar qualquer possível lesão que poderá potencialmente piorar com uma tentativa de levantar a mota.



Desequipar e pedir ajudar são ótimos recursos de auto-preservação e de aproveitar para abrir o caminho a historias para contar. Foto boringadv.com


Tendo garantido que estamos inteiros, preferencialmente na berma do track, é então altura de garantir a segurança do local, principalmente se estivermos numa zona sem visibilidade.

Como as motas não têm triângulos de sinalização como os carros, sozinhos, podemos deixar o capacete e o casaco em cada ponta da estrada para alertar possível trafego, ou se estivermos com companhia, uma mota atravessada com os piscas ligados é um claro aviso para qualquer um de que algo se passa e que devemos abrandar.
 
Agora que sabemos que estamos intactos e que fizemos o nossos melhor para não levar com ninguém em cima, resta-nos levantar a mota, algo que se estivermos com amigos, deve ser feito com o seu auxilio.
 
Motociclismo é um desporto individual feito em grupo, tal como é um desporto em esquema de maratona e não de sprint, por isso, pedir ajuda vai permitir substituir o alto desgaste individual da manobra por um desgaste mais reduzido a nível coletivo.

KIT DE PRIMEIROS SOCORROS

É inegável a possibilidade de nos aleijarmos quando andamos de mota, por isso, temos de tomar uma decisão; esperar que alguém nos ajude se isso acontecer, ou estarmos preparados para tomar uma atitude, seja para connosco, ou para com qualquer outra pessoa, dentro ou fora da mota.
 
Tendo essa ideia presente, aconselho sempre que todos nós como motociclistas façamos um curso de primeiros socorros, e se possível, especifico para motociclistas.
 
Essa formação deve-nos dar as ferramentas necessárias para não só reanimar alguém, como tratar de simples cortes, por exemplo.



Devemos estar sempre preparados para o pior para poder aproveitar o dia a dia em segurança e conforto em cima de uma mota. Foto de um treino de primeiros socorros para motociclista no dia de treino de campo. Foto via Strefa Enduro


Cursos mais completos englobam temas como detetar hemorragias internas, estabilizar ossos partidos, ou até mesmo tratar de amputações em campo.
 
Com isso em mente, independentemente do curso, o que é importante é não só ganhar os conhecimentos mínimos, mas igualmente aprender a construir e cuidar do nosso kit médico, um equipamento vital para qualquer aventureiro.
 
Digo construir o nosso próprio kit médico porque infelizmente encontra-se muita gente com kits pré comprados em que não só não sabem o que está lá dentro, como não o sabem utilizar, tornando a sua existência meio irrelevante.
 
Por sinal, uma situação muito similar ao que acontece relativamente a kits de mecânica de campo, por exemplo.


Saber usar o kit médico tal como o kit de mecânica são trunfos fantásticos na mão de qualquer aventureiro, seja para proveito próprio, ou para ajudar alguém. Foto ridermagazine.com


No entanto, kits médicos ou de primeiros socorros, têm um passo extra que os de mecânica não têm, que são datas de validade em muitos dos seus constituintes.

Desta forma, para poderes não só maximizar a tua segurança, como a de outros que possas encontrar nos tracks, garante que não só tens um kit de primeiros socorros contigo, como que o sabes utilizar, e manter, a vida de alguém pode depender disso.

MOSTRA O RESPEITO QUE QUERES RECEBER

Agora que sabemos como tentar ao máximo preservar a nossa integridade física, torna-se primordial garantir que não nos esquecemos que um trilho aberto ao público não é uma pista.
 
Isso significa que além de poder, e muitas vezes ser utilizado por outras pessoas, a pé ou em veículos de lazer ou profissionais, como tratores, também é casa de vida selvagem dos mais variados tamanhos e feitios.
 
Essa é a razão pela qual apesar da maioria dos trilhos não ter sinalizações, continua não só a ter regras de transito, como de bom senso.
 
Assim, gestos simples como abrandar o tanto quanto possível quando passamos por pessoas ou casas, respeitar os sinais de não passagem ou de “por favor feche o portão”, não passar por cima de plantações, tal como dirigir uma ou duas palavras ás pessoas que encontramos nos trilhos, fazem toda a diferença no tribunal da opinião pública, tal como no prazer da nossa atividade.


Cabe a cada um de nós garantir que sinais destes não se vão espalhar e massificar pelos trilhos deste nosso Portugal. Foto Hugo Pinto


De uma forma geral, para podermos continuar a garantir a continuidade do nosso desporto, basta-nos mostrar o respeito pelos outros que gostamos que nos mostrem a nós, por mais que isso, no limite, possa quebrar o nosso ritmo de andamento.

RESPEITA A NATUREZA

Estando garantida a nossa segurança e o respeito pelos trilhos e populações que ai vivem, falta somente garantir que respeitamos a natureza onde eles estão inseridos.
 
Existem poucas experiências tão gratificantes para amantes do fora de estrada de aventura como o sair com a mota e tenda ás costas para voltar somente um ou dois dias depois.
 
Ainda que não exista nada de errado com esse conceito, antes pelo contrário, existem alguns pontos a manter em mente.
 
Se em muitas partes do mundo esta liberdade é altamente promovida, em muitas, como Portugal, é altamente regulada, pelo que se torna vital garantir a legalidade da nossa escolha de local de acampamento, ou mesmo de piquenique.
 
Foguear para uma refeição pode ser ilegal em muitos locais e alturas do ano, e se podemos ser um excelente recurso para as autoridades como primeiro aviso de incêndio, devemos evitar ao máximo começar um por acidente.


Nos trilhos, podemos sempre ajudar, seja alguém, seja com limpezas de caminhos, ou até mesmo um olhar mais atento a sinais de alarme quando estamos a andar em época de incêndios. Foto Edventure 547


Para fechar, e na nota máxima de respeito á natureza onde gostamos de andar, fica a ideia de deixar sempre o local onde estamos melhor do que o encontramos.
 
Por isso, garante que tens um saco contigo, seja para te certificares que não vais deixar lixo por onde passas, mas também para se vires algum no chão, o apanhas para o depositar no local apropriado mais à frente.
 
Com respeito por nós próprios, pelo próximo, e seguindo simples gestos de bom senso, conseguimos não só garantir um futuro saudável para a nossa modalidade, mas igualmente que a mesma têm primeiro que tudo, um futuro.

 

Your riding buddy is trying to kill you!


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