A mentalidade do sucesso

A mentalidade do sucesso

A técnica é um “ser vivo”, porque tal como todos os outros a que estamos habituados, a técnica evolui.

Isso significa que as técnicas de há 20 anos não são iguais às de hoje, e estarmos conhecedores dessas diferenças vai-nos ajudar a maximizar a nossa performance. 

Neste artigo, vamos falar de como devemos adaptarmo-nos aos tempos, tal como a nossa forma de pensar se queremos tirar o máximo partido das nossas motas e aumentar a nossa segurança.

 

A TÉCNICA ESTÁ VIVA

Eu sei que esta visão pode parecer meio romântica, mas eu sou um apaixonado por motas, e isso traduz-se no que faço como instrutor, e no que escrevo. 

Ainda assim, e romantismos à parte, a analogia funciona, porque a evolução da técnica é uma clara adaptação da mesma ao seu meio ambiente e aos tempos, à semelhança do que acontece na natureza.

Isto diz-nos que apesar de as motas serem uma evolução das bicicletas, paralelismos entre andar mota e andar a cavalo existem, assumindo, claro está, os cavalos como o antecessor da bicicleta.

Ainda que o cavalo tenha força motriz “ás duas rodas”, algo que à parte de algumas motas não é a norma, no restante as similaridades em traços gerais estão lá.


Comparativo de imagens via blog.54ka.org & gatedrop.comComparativo de imagens via blog.54ka.org & gatedrop.com

 

Para todos os efeitos, em ambos os casos estamos sentados no centro do “veiculo”, com necessidade de nos prendermos pelas pernas para não cair, relaxar os braços para ter mobilidade, e manter as costas direitas com a anca numa posição de separação para ter controlo. 

Esta similaridade entre o conceito básico de equitação e de condução fora-de-estrada é claro.

Onde começa a divergir é na óbvia diferença dos veículos, e no nosso caso, das motas, na imensa evolução que as mesmas sofreram desde a sua conceção.

Um claro exemplo de adaptação a essa evolução é Valentino Rossi, que desde o início da sua carreira até ao seu fim alterou a sua técnica de forma a poder acompanhar a evolução das suas motas.

 

Valentino Rossi via redbull.comValentino Rossi via redbull.com

 

Essa alteração foi de tal modo que chegou mesmo a implementar uma nova técnica, que ficou conhecida como o Doctor Dangle, aplicada hoje em dia por todos os pilotos de MotoGP. 

Para nós, no fora-de-estrada, podemos comparar, por exemplo, as técnicas do passado, como as aplicadas por Roger de Coster, cinco vezes campeão do mundo de motocross durante os anos 70, e hoje diretor Desportivo da KTM e Husqvarna USA, com o Chase Sexton, para mim o piloto com a melhor técnica da atualidade.

 

Roger de Coster e Chase Sexton via motocrossactionmag.comRoger de Coster e Chase Sexton via motocrossactionmag.com

 

Ao fazê-lo, vamos encontrar maioritariamente diferenças de pormenor e abordagem, porque de modo geral mantém-se baseadas nos mesmos princípios, pois nem o corpo humano, nem as motas mudaram a sua essência.

No entanto, são as similaridades que levam muitos ao engano de que poderão estar a aplicar as melhores técnicas, ao facilmente desvalorizarem os pequenos contrastes entre o passado e o presente.

Ainda assim, essas diferenças têm um grande impacto, o que significa que para nós como pilotos profissionais ou de fim de semana, aplicarmos as técnicas mais recentes vai drasticamente alterar a nossa performance e segurança.

 

TÉCNICA TEÓRICA E PRÁTICA

Como instrutor sou um geek de técnica e posição corporal, como já devem ter entendido.

Conheço muitos que não são, e isso não é obrigatoriamente errado, são simplesmente abordagens diferentes.

Ainda assim, eu sou, e como tal, regularmente ouço a crítica de que a minha forma de ver e falar de técnica é muito bonita, mas na têm pouca aplicação prática.

Argumentam que assim que o terreno se dificulta, ou que o pelotão lhes começa a morder os calcanhares, ninguém consegue aplicar o que estamos a treinar.

Essa visão remete para uma ideia de técnica teórica e técnica prática, no entanto, isso não existe.

Técnica é técnica, e a sua aplicação é factual.

Ou a estamos a aplicar, ou não estamos, não existindo uma diferenciação entre teoria e prática.

 

Via promotocross.com

Via promotocross.com

 

O que se altera então, é a capacidade de aceitação do erro, um conceito muito diferente.

É normal pilotos profissionais ao mais alto nível fazerem dezenas de pequenos erros por prova.

Onde eles se destacam de nós comuns mortais, é na capacidade de aceitar que cometeram um erro, e o mais rapidamente possível voltarem a aplicar a sua melhor técnica.

Quantas vezes já cometeste um erro e ficastes horas a pensar nele?

Todos o fazemos.

Quem nunca chegou à típica paragem para visitar as traseiras do pinheiro mais próximo e imediatamente começou a relatar todas as vezes em que “quase me matei” no percurso até ali?

Essa memória presente significa que parte do nosso foco ficou nesses erros, e não em estar a tentar aplicar aquilo a que muitos erradamente chamam de técnica teórica.

 

ERRAR É HUMANO

Da mesma maneira que a mota vai para onde estamos a olhar, de certa forma o nosso foco segue o que estamos a pensar. 

Ao ficarmos focados num incidente ou susto, vamos automaticamente fazer o replay do mesmo na nossa cabeça, focando a nossa atenção na solução de um evento passado sobre o qual não temos mais controlo.

Não quero que me interpretem mal, é importantíssimo rever o que fizemos de forma a encontrar soluções para não repetirmos o mesmo erro, mas não na altura.

 

James Stewart com erros técnicos de curva via livemotocross.comJames Stewart com erros técnicos de curva via livemotocross.com

 

Eu pelo menos garantidamente não quero que um cirurgião fique a pensar que devia ter feito uma incisão de 4cms e não de 5 enquanto têm um bisturi dentro de mim, quero-o focado no que está a fazer.

Na mota, de igual forma, vivemos no momento e tentamos de alguma forma preparar o futuro, mas nunca devemos viver no passado.

Essa preparação futura vem de uma correta posição técnica para o movimento, algo que falaremos noutro artigo, e de uma correta forma de pensar quando estamos sentados na mota.

Isso significa que devemos sempre treinar para ser o mais tecnicamente perfeitos possível, mas aceitar o facto de que iremos cometer erros na aplicação dessa técnica.

 

Via off.whip.liveVia off.whip.live 

 

Permite-te errar, e isso vai-te permitir mais rapidamente voltares a aplicar a tua melhor técnica para estares sempre em controlo, e não a correr atrás do prejuízo do erro progressivo que a falta de foco irá desencadear.

Errar é humano, e ao aceitares isso, vais-te tornar cada vez mais rápido, consistente e seguro.

  

A TÉCNICA NOS DIAS DE HOJE

Parte da aceitação do erro é aceitar que a nossa técnica precisa de trabalho constante.

Não existe ninguém neste planeta que seja sempre tecnicamente perfeito, com uma considerável percentagem dos utilizadores de duas-rodas fora-de-estrada a ficarem muito aquém dos mínimos olímpicos.

Não digo isto por ser instrutor e querer vender aulas a toda a gente, por mim, podem escolher aprender comigo, com qualquer outra escola, ou com acesso aos inúmeros recursos disponíveis online.

Digo-o por ser verdade, e querer que estejam mais seguros e sejam mais capazes de tirar partido do investimento que já fizeram na mota.

Eu próprio como instrutor invisto muito tempo e dinheiro na minha formação continua para me manter a par dos tempos.

Se isso não chega, basta-nos ver pilotos profissionais, que ao mais alto nível trabalham incessantemente técnica para conseguirem aplica-la do modo mais automático possível.

Se eles, que já a dominam melhor do que ninguém procuram ajuda de treinadores e instrutores de técnica como eu para os acompanhar, será narcisista achar que sabemos melhor.

 
Via motoxschmiede.deVia motoxschmiede.de 

 

Isto porque eles sabem que uma ligeira alteração na posição da anca, dita a diferença entre ter controlo ou não sobre a roda de trás.

Ou porque sabem que a alteração da posição do pé, muda o tempo que vão demorar a alternar entre estar sentados e em pé, tal como a energia que vão despender para prender os joelhos á mota.

Agora se muitos acham que esse nível de pormenor poderá ser excessivo para um piloto amador ou guerreiro de fim de semana, é importante vermos que motas estamos a usar.

Quando marcas são claras no seu marketing ao dizer que os seus veículos são ready to race, então nós, como compradores, também o devemos ser, até certo ponto.

Estou longe de acreditar que temos todos de ser atletas profissionais para nos divertirmos em segurança numa mota, mas devemos todos pelo menos ter as bases teóricas e práticas das técnicas que os melhores usam.

Afinal, as motas que hoje usamos são mais capazes do que muitas que venceram campeonatos no passado, e já nessa altura os melhores do mundo treinavam para tirar o máximo partido delas.

Além disso, e como discutido, a técnica está viva, porque evolui, pelo que o que é certo hoje, poderá não ser o mais correto amanha.

 

Via electricwhip.comVia electricwhip.com

 

Essa realidade fica ainda mais espelhada com as claras diferenças de técnica entre motas a combustão e elétricas, motas essas que cada vez mais fazem parte da nossa realidade.

Por isso permite-te errar, permite-te a humildade de aceitar que aprender não ocupa lugar e nunca deverá parar, e depois, dotado da melhor e mais atual informação, aplica-a à tua realidade.

Vais ser mais rápido, mais consistente, mais seguro, e vais-te divertir muito mais cada vez que te sentares na mota.

 

Your riding buddy is trying to kill you!


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