A importância de saber andar fora da mota

A importância de saber andar fora da mota

Ninguém discute que de uma forma geral, para se poder andar de mota é necessário estar efectivamente em cima da mota. 

Alguns levam esta definição ao limite com truques dignos de qualquer circo, no entanto, de uma forma geral, continuam a estar em cima da mota de alguma forma.

Ainda assim, eu acredito que para podermos tirar o máximo partido das nossas aventuras, ou mesmo maximizar a nossa capacidade em pista, saber andar fora da mota é um recurso técnico primordial, e hoje, é sobre ele que vamos falar. 

 

NÃO NASCEMOS EM CIMA DA MOTA

Para muitos ir a um stand ou oficina de motas é uma actividade que se cinge a ver motas e material, ou simplesmente reparar ou instalar peças e componentes. 

Para mim, ainda que essa realidade seja semelhante, existe algo mais que me capta sempre a atenção, ver os mecânicos e os comerciais a mexerem motas de um lado para o outro.

A leveza, facilidade, e quase desdém com que motas são precisamente movidas de um lado para o outro, seja ligadas ou desligadas, com eles em cima ou fora dela, é no mínimo hipnotizante.

Por outro lado, olhar para a maioria dos motociclistas a mover as suas motas seja em garagens, a entrar ou sair de carrinhas, ou nos mais variados parques de estacionamento e trilhos é um total contraste da realidade anterior.

 

smh.au.comImagem de smh.au.com

 

O porquê desta dicotomia de realidades é relativamente fácil de compreender; enquanto uns por passam horas do seu dia a treinar como mover motas da forma mais rápida e fácil, outros passam essas horas a fazer kms em cima da mota. 

No entanto, e considerando que grande parte de nós não tem qualquer conforto ou à vontade a mexer as nossas motas quando estamos fora delas, deveríamos aprender alguma coisa com aqueles que o fazem de forma totalmente blasé?

 

adventuresnz.comImagem de adventuresnz.com

 

Sem dúvida!

Afinal, nem todas as situações de condução fora-de-estrada implicam andar de rabo sentado.

 

PESO, EQUILÍBRIO, E DIMENSÕES

É muito comum em treinos com motas de ADV começar-se com uma familiarização da mota, seja por intermédio de exercícios estáticos, com a mota desligada, ou dinâmicos, com a mota em andamento.

No entanto, este tipo de trabalho não é tão comum em motas mais pequenas e enduristas, e isso é uma falha.

Nas ADV’s, esse tipo de exercício têm o intuito claro de não só dar a conhecer as dimensões da mota ao utilizador, mas também o seu ponto de equilíbrio e distribuição de peso.

 

Imagem de advpulse.comImagem de advpulse.com

 

Ao compreender que uma mota pode ser controlada com uma mão, ou até mesmo um dedo, a percepção de tamanho, peso, distribuição de massa, e noção da influência que fazemos na mota alteram-se por completo.

No entanto, essa aprendizagem é tão válida e crucial para uma mota de 250kg como é para uma de 100kg. 

Se numa “gorda” ter este conhecimento bem interiorizado muda drasticamente a forma como encaramos a mota, numa endurista muda o tipo de terrenos em que nos iremos sentir confortáveis.

No entanto, os benefícios não se ficam só pelo conforto em diferentes tipos de terrenos.

Se há uma situação de stress comum a quase todos os praticantes de fora-de-estrada é parar, por escolha ou obrigação, num local onde vamos ser obrigados a ficar em desequilíbrio.

Um sítio onde fomos forçados a desmontar, junto a uma ravina, numa subida íngreme, ou até mesmo depois de uma queda ficarmos sem posição para subir novamente para a mota.

Imagem de Hispania.esImagem de Hispania.es

 

Saber andar de mota fora da mesma, abre um mundo de opções, e isso vai-te permitir manteres-te calmo e com uma respiração e ritmo cardíaco controlados, algo importante de que já falamos no passado.

Ao conseguires manter esse controlo, vais poder fazer melhores escolhas, e sair de qualquer posição com o mesmo à vontade com que sais de qualquer parque de estacionamento depois de meteres a primeira e enrolares o punho.

 

TREINAR NA GARAGEM

Ao contrário de curvas, subidas, descidas, e demais técnicas dinâmicas, começar a aprender a andar fora da mota requerer pouco mais do que a mota, com muitos dos exercícios a poderem ser feitos até sem equipamento.

À medida que fores progredindo nos exercícios, irás obviamente necessitar de te equipar e procurar locais mais amplos como parques de estacionamento ou clareiras, mas para começar, permite-te relaxar.

Não esquecer, repetição é chave para memorização, pelo que a introdução de algumas destas técnicas no teu aquecimento antes de passeios ou corridas pode também ser uma opção a considerar.

Com uma lista imensa de exercícios e variantes possíveis, nem em treinos os utilizo todos, por isso, criar aqui uma lista tipo enciclopédia ia ser mais confuso do que qualquer outra coisa.

Ainda assim, não poderia fechar o artigo sem partilhar alguns exercícios, tal como o seu objectivo, por isso tira notas, e prepara o teu próximo treino.

 

TIRAR-LHE AS MEDIDAS

O primeiro exercício que recomendo sempre é com a mota desligada, engatada, e fora do descanso, aprender a dar uma volta de 360º à mota mantendo somente uma mão na mota de cada vez.

 

Imagem BN EnduroCampImagem BN EnduroCamp

 

Começando pelo lado do descanso, onde a larga maioria de nós se sente mais confortável, a primeira coisa a fazer será com as duas mãos na mota retirar o descanso e encontrar um ponto de equilíbrio. 

Dai, é escolher o sentido dos ponteiros do relógio, e começar a dar a volta à mota, indo passando de mão em mão até se chegar ao ponto inicial, sendo perfeitamente irrelevante em que zona da mota se agarra no processo.

Não só aconselho a que este exercício seja feito nos dois sentidos, aconselho também a que entre cada troca de mão para segurar a mota que se espere o tempo necessário para equilibrar a mota antes de se dar o próximo passo.

 

Imagem de Zulkifli ZainalImagem de Zulkifli Zainal

 

A ideia é criar confiança e conforto, não sobreviver ao exercício o mais rapidamente possível.

Desenvolver esta simples técnica permite-nos estar confortável na mota em toda a sua plenitude, podendo numa queda, por exemplo, estar-se em total conforto a segurar a mota de qualquer forma após a levantar do chão.

 

TUDO O QUE É DEMAIS, É DEMAIS

Um grande problema quando falamos de peso de motas não é obrigatoriamente o seu peso, mas onde o centro de gravidade do conjunto se encontra.

Baixar lentamente até ao chão uma R1250GS com o seu bóxer a servir de lastro numa zona muito baixa da mota, ou uma 450 de Rally com os seus tanques altos e instrumentos, pode ser uma surpresa para muitos sobre qual vai pesar mais ao mesmo ponto de inclinação.

Não quero com isto dizer que uma 1250 é mais leve que uma 450 de Rally, quero dizer que peso não é tudo, principalmente quando saímos de uma posição 100% perpendicular ao chão.

 

Imagem BN EnduroCampImagem BN EnduroCamp

 

Isto significa que com a mota desligada e engatada, baixa-la lentamente como se a quiséssemos encostar ao chão vai-nos dizer claramente qual o máximo que podemos ir com essa mota especifica, antes dela se tornar demasiado pesada para nós.

Ter este conhecimento vai não só desbloquear algumas técnicas dinâmicas, como vai igualmente ajudar-nos a decidir quando é uma boa altura para deixar a mota cair.

 

Imagem de adbmag.comImagem de adbmag.com

 

Tentar meter o pé no chão para suportar o peso de uma mota para evitar que esta caia é como muitas lesões acontecem, e sabendo de antemão onde está esse limite, podemos ajudarmo-nos a evitar problemas.

 

TODAS AS MOTAS TÊM DOIS LADOS

Por definição todos aprendemos a entrar e sair da mota pelo seu lado esquerdo, tal como a manobra-la dessa mesma posição.

No entanto, toda e qualquer mota têm outras formas de ser manobrada, e para este efeito, estar confiante quer a subir para a mota, quer a manobra-la do lado direito é um recurso crucial.

 

Imagem de Hispania.esImagem de Hispania.es

 

Desenvolver esta técnica é tão simples quanto parece, bastando portanto utilizar o conhecimento adquirido no primeiro exercício, rodar o corpo para o lado direito da mota, e aprender a manobra-la dai.

Aconselho no entanto, e de forma a que se faça uma evolução total e gradual, que este exercício seja feito a quatro tempos.

 

Imagem BN EnduroCampImagem BN EnduroCamp

 

1 – Com a mota desligada, e do seu lado esquerdo, andar uns passos para a frente e para trás puxando e empurrando a mota pelo guiador.

Aumentando a dificuldade do exercício, poderemos dar uns passos para a frente ligando a mota e utilizando o motor com um equilíbrio de embraiagem e acelerador, e uns passos para trás forçando a suspensão frontal.

2 – Com uma mão na embraiagem e uma na traseira da mota, seja no banco, ou numa pega, andar uns passos para a frente e para trás puxando e empurrando a mota pelo guiador e por onde quer que tenhamos escolhido por a nossa mão direita.

Aumentando a dificuldade do exercício, poderemos ligar a mota e dar uns passos para a frente utilizando somente embraiagem, e uns passos para trás desembraiando a mota e puxando a mesma pelo guiador, mantendo-a no seu ponto de equilíbrio vertical.

3 – Este exercido torna-se igual ao anterior, com a diferença que agora estamos do lado direito da mota, e que na sua versão mais avançada estaremos a controlar o movimento para a frente com um ajuste entre o travão da frente e o acelerador.

4 – Com a excepção de que agora estamos do lado direito da mota, tudo o resto é semelhante ao efectuado no exercício 1, desenvolvendo assim um conforto muito mais abrangente para com a mota.

 

RESUMO

Apesar de haver muitos mais exercícios semelhantes a este que podem e devem ser treinados, desenvolver estas técnicas básicas vai drasticamente alterar a forma como vês a mota, parado, e em movimento.

Da mesma forma, estes três exercícios básicos podem e devem ser utilizados sempre que vamos para uma mota nova.

Tive à uns tempos uma conversa com um aluno que por questões profissionais utiliza diversas motas diferentes todos os anos. Nessa conversa, foi-me dito que ainda hoje, quase uma década depois do nosso primeiro treino, este ainda utiliza estes e outros exercícios sempre que vai para uma mota nova.

Estes rápidos e simples exercícios, seja como motor ligado ou desligado, diferença que influência em muito a dinâmica dos mesmos, funcionam, e são um recurso que não deve ser descurado.

Por isso aposta em sair da mota para aprenderes a andar em cima dela, e vais ter uma grande surpresa quando vires a tua confiança e à vontade a aumentarem.

 

Your riding buddy is trying to kill you!

 


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